Uma grave denúncia deve deixar ainda mais cambaleante à já incerta administração petista em Joinville. Agora, uma carta divulgada pelo vereador Odir Nunes (DEM), relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a compra de móveis escolares pela Secretaria de Educação de Joinville, evidencia ainda mais uma suposta rede de fraude envolvendo empresários, funcionários públicos e o secretário de educação do município, Marcos Aurélio Fernandes (PT). Trata-se de possíveis indícios de um esquema de superfaturamento e pagamento de propina na licitação 291/2009, prevista em um valor que ultrapassa R$ 4,7 milhões.
A carta, que justifica seu anonimato no medo de perseguições e retaliações do governo municipal, devido a riqueza de detalhes, deixa nas entrelinhas que possa ter partido de alguém ligado a própria administração municipal.
Conforme a carta, o secretário de educação Marco Aurélio Fernandes e o empreiteiro Gilmar Gonçalves, proprietário da Lugano Construtora Ltda, que segundo o relato, nutrem uma amizade bastante estreita com o prefeito Carlito Merss (PT) e com a primeira dama Marinete Merss, estariam no comandando de um alegado esquema de corrupção. “O secretário municipal de Educação, juntamente com o Sr. Gilmar Gonçalves que é um empreiteiro muito amigo do prefeito e da Primeira Dama, vem gerenciando uma extensa rede de corrupção e fraudes em licitações relacionadas a compras e serviços para a Secretaria de Educação, juntamente com membros da Secretaria de Administração.”, alerta o documento.
A carta detalha a possível fraude do processo licitatório número 291/2009, que visava a compra de móveis escolares para a rede municipal de ensino, realizado em setembro de 2009. O denunciante conta que mesmo antes de ser aberta a licitação, já se sabia o nome do vencedor, ou seja, a Indústria de Móveis Cequipel Ltda.
Secretário Marquinhos é apontado como o cabeça do esquema
A carta explica que o representante da Cequipel, Sérgio Luiz Ouriques, o secretário de educação Marcos Aurélio Fernandes e o empreiteiro Gilmar Gonçalves se reuniram em meados de 2009, para montar o esquema. “O município inauguraria como de fato inaugurou as Escola Municipais PREFEITO LUIS GOMES E DR. NELSON DE MIRANDA COUTINHO com móveis que o secret. Marquinhos iria conseguir como de fato conseguiu com o Secretário de Estado Paulo Bauer, os quais não seriam devolvidos como de fato não foram e seriam incluídos na licitação e não precisariam ser entregues como de fato não estão sendo entregues e o valor direcionado para alguém de confiança do secret. Marquinhos.”, registra o documento.
Marido de vereadora teria recebido propina de
R$ 200 mil para abandonar a licitação
A licitação foi marcada por contestações, erratas e um mandado de segurança, que segundo a carta, não passou de encenação para legitimar o suposto certame fraudulento. Porém, em determinado momento, uma inusitada proposta da empresa Vila Mobille ameaçou o suspeito pregão. “O grande problema surgiu quando o Sr. Martinho, marido da vereadora Tânia Eberhardt e proprietário das empresas CIVILLE e VILA-MOBILE roeu a corda e no dia da Licitação apresentou preços 30% inferiores aos apresentados pela CEQUIPEL e consequentemente seria o vencedor da Licitação”, afirma a denúncia. A carta prossegue informando que embora o nome de Martinho não conste no contrato das empresas, e sim o de seu genro Fábio, é ele que manda nas duas empresas.
O denunciante relata que nessa ocasião entrou no esquema uma pessoa de nome Tarcisio, concunhado do secretário de educação. Tarcisio, em conjunto com o representante da Cequipel e o empreiteiro Gilmar, teriam negociado com Martinho a desistência da empresa Vila-Mobille em troca de R$ 200 mil. “Depois de muita conversa e muita barganha por parte do Sr.
Martinho ficou acertado que eles repassariam R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para que Martinho aceitasse ser desclassificado sob a alegação que as amostras não foram apresentadas em tempo hábil e tudo bem. O pacto foi fechado em fins de novembro ou inicio de dezembro de 2009″, finaliza a carta.
Servidor de carreira detectou algo suspeito e foi substituído
Para Odir Nunes, outras situações graves em relação a licitação foram constatadas nos depoimentos colhidos na CPI. Odir cita que vários servidores assinaram o hipotético recebimento dos móveis, mas, apenas um deles afirm ou ter efetivamente recebido os materiais. Sandra Lopes de Oliveira Santos, gerente da unidade de administração da Secretaria de Educação, disse que recebeu os móveis, ainda nas caixas, desmontados, na sede da Cequipel, em São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba.
Odir questionou a servidora sobre o porquê de os móveis terem sido “entregues” em Curitiba, se serviriam ao município de Joinville.
Outro fato que chamou a atenção do parlamentar foi que o pregoeiro originalmente designado para o processo, ter abandonado a licitação.
José Carlos de Souza afirmou a Odir que não se sentia seguro em dar continuidade ao Pregão 291/2009. Silva é servidor de carreira, com mais de 20 anos de serviços prestados a prefeitura. Ele foi substituído pela servidora comissionada Glauciane Gonçalves, que declarou na CPI. “Eu, como coordenadora de licitações da Secretaria de Administração, tenho prerrogativas para dar prosseguimento a qualquer processo licitatório, e assim o fiz”, afirmou no interrogatório da CPI. De acordo com a denúncia que originou a CPI, a empresa paranaense teria vencido processo com um valor quase 100% superior ao da empresa segunda colocada.
Procurador Davy Lincoln No dia 10 de março desse ano, a carta contendo a denuncia foi parar nas mãos do procurador da republica Davy Lincoln Rocha, do Ministério Público Federal. No dia 12 do mesmo mês, Lincoln encaminhou a denuncia através do oficio número 77/2010, ao promotor Assis Marciel Kretzer, da 13ª Promotoria de Justiça do Ministério Público Estadual. No dia 28 de setembro, Kretzer instaurou o Procedimento Administrativo Preliminar número 06.2010.004407-3 para apurar os fatos narrados na carta.
Cequipel já foi condenada pelo TCU
Em 2007, o grupo Cequipel, lucrou quase R$ 21 milhões em negócios com o governo Roberto Requião (PMDB). Em 2006, a empresa forneceu 22 mil televisores para a atual administração. De acordo com deputado estadual do Paraná, Valdir Rossoni (PSDB), os aparelhos que custaram R$ 18,9 milhões ao governo estadual, foram superfaturados em mais de 22%. Porém, antes, em 2004, a Cequipel foi condenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por fraude em licitação no município catarinense de Rio do Sul. Os ministros do Tribunal de Contas da União chegaram a declarar a empresa inidônea para participar, pelo prazo de cinco anos, de licitação na administração pública federal.
Além disso, conforme o TCU, as três empresas do grupo – Cequipel Indústria e Comércio de Móveis LTDA, Ergo-Mobili Indústria e Comércio de Móveis Ltda e Fornecedora Geral de Móveis Ltda participaram de uma mesma licitação, realizada através de carta convite, da Escola Agrotécnica Federal de Rio do Sul (EAF), em Santa Catarina, para aquisição de equipamentos.
Segundo o ministro-relator, Lincoln Magalhães da Rocha, o grupo teria feito um “conluio com a administração da EAF para restringir o caráter competitivo” do processo. “Com certeza estamos diante de mais um daqueles conhecidos casos de ‘simulação’ de licitação, principalmente quando se trata da modalidade convite. Ou seja, escolhe-se uma empresa para efetuar a compra, e esta se encarrega de ‘apresentar’ outras duas firmas com toda a ‘documentação montada’, especialmente as propostas”, declarou Rocha ao jornal do Estado, do Paraná.
Mesmo com a condenação do TCU, a empresa continuou participando de licitações, inclusive no Paraná. Depois de doar R$ 645 mil para a campanha de Requião em 2006, o grupo Cequipel recebeu no mesmo ano mais de R$ 4,2 milhões pela venda de móveis de escritório e carteiras escolares para o Estado.